28/01/2020

Cremar

O barulho do já tão fatigado ventilador, trac, trac . E eu ensimesmado olhando calado para o teto. Olhando para dentro de mim, perdido. Com medo de dormir,pois mais tarde hei de acordar, e fico ansioso e não durmo porque não queria acordar, vou escutando barulhos, latidos, latidos, tosses, ouço as batidas fatidicas do meu coração e um certo pigarro na garganta. Ouço também bem lá no fundo. Minto. Bem à flor da pele, sinto um desespero de deitar a cabeça ao forno e ter com Hades. Me aliviar fosse  do que fosse. Tudo isso aqui é dor como for. Tudo isso aqui é um estrangeirismo carcomido por mentiras de vésperas e mentiras de amanhã.  Estelionatários emocionais. Surtos psicóticos . Realidades paralelas. Querelas, perrengues. Velas sem barcos. Velas e escuros. Não há para onde escapar.  Sem remos, sem remadas. Tudo é só. Tudo é véspera. Tudo é escarro. Lama.
Redemoinhos em mim. Tonto, tonto, o que sei de mim ? Tonteria.  Vou girando no meu próprio eixo. Que eixo? Arre! Não quero ser enterrado. O fogo deve ser purificador, libertador. Toda essa existência . Todo esse mal estar. Todo esse estar aqui para nada , por nada e por ninguém. Toda essa véspera. Toda essa véspera. Meus pés estão gelados , mas a noite vai quente. Deitam quentes meus pesadelos. Sonhos? Quimeras! Serpentes de mil cabeças. De mil mentiras , de mil interesses, mas não o meu interesse. São os segredos de 22° de giro para esconder o apego a um like de bosta. A um elogio falso. A um uso descartável de um corpo frágil de um ego frágil. De uma vida frágil. I made you in a sort of way.
Likes são afetos pelos quais alguns vivem e outros morrem... Morremos.
Não ter mais senha no celular é libertador.

25/01/2020

Oi, Narciso

" toda máscara tem bucaros por onde deixa escapar a verdade". Não sou só o motorista. Sou também o mantenedor miúdo, que me  preocupo com coisas miúdas, e oras, vejam só, essas coisas miúdas sempre precisam estar por perto. Sou também o fotógrafo provedor de likes alheios. Mas eu que sou o low-self-worth.
Agora sou garçom de likes. Em troca, reparem bem , de uns elogios superficiais , para uma vida idem.
O ecrã é visualizado antes de mim nas manhãs. Por último nas noites. Durantes nas conversas. Porque meu comportamento é disruptivo.
É estranho, pois não vivo da esperança do que não tenho, dos likes que recebo ou não. Não vivo desesperadamente photoshooting myself ALL the time. Tampouco obrigando a quem quer que seja a fazê-lo sobre pretexto de habilidades inexistentes. Para suprir necessidades exibicionistas que beiram o narcisismo.
Sou mais do que o motorista. Do que o fotógrafo, do que o idiota que vive a esperar pelo um pouco de afeto e de sexo. Sou mais que elogios superficiais antes de uma pegada de câmera fotográfica e cabelos molhados e poses repetidas. - tire fotos minhas. Você é bom nisso. Não, Darling. Não sou bom nisso, nem em qualquer outra coisa no mundo. E também não sou cego.

07/01/2020

A mordida do cachorro: o afeto que me resta

O único afeto que me sobrou foi do cachorro que não gosta de mim , mas que gosta de mim, que me olha quando lhe dou alimento. Seus olhares me fingem amor, mas é  só desejo de alimento. É  sempre isso: um desejo a ser suprido. Nem o cão me ama como sou, a autenticidade, tem seu preço.
Cadáveres insepultos, covas rasas. Todo mundo tem direito de ser sepultado. Todo amor tem direito de ser sepultado.
Eu tenho direito de ser sepultado. É o único direito a respeito que eu tenho. Não adeque a mim. Não se encaixe em mim. A vida não é  isso. Não me satisfaça. As pessoas se juntam para se decladiarem  e serem lindas uma com as outras . As pessoas são feias. As pessoas, você é  uma pessoa. Somos feios. Infelizes. A felicidade é uma ilusão  que seja uma ilusão solitária. É mais verdadeira.
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02/01/2020

O spleen me assola , o mal do século  que já findou há longa data sobrevive em mim. Me dilacera.  Esse monstro que  que me quer morto. Eu me quero morto. Duvido da mais "bondosa alma", da mais mal trapilha alma. Porra! Não me aguento de pé.  Estou de joelhos esperando ser ceifado pelo pescoço.  Um vintém,  minha vida não vale nada.
Promessas vãs.  Amores dúbios. Amores de telas de cristais líquidos.