Quem vai me indenizar pelos gritos que engoli a seco?
Pelos cortes invisíveis que sangram por dentro
e empapuçam meu silêncio de ferrugem?
Quem vai cobrir o rombo que a vida fez em mim?
Essa hemorragia lenta
que começa na alma
e escorre pelos olhos sem aviso?
Morrer talvez não doa.
Mas viver arranca o couro.
É prego no peito,
faca cega na costela,
agulha suja espetando os dias.
Conheço todas as dores porque elas me comeram por dentro.
Roeram meu fígado,
mastigaram meus nervos,
lamberam minhas vísceras como se fossem banquete.
A quem envio esse corpo em ruínas?
A que autoridade reclamo a amputação dos meus sonhos?
Quem me paga pelos pedaços de mim
que abandonei em cada escolha fictícia?
Me prometeram futuro —
me entregaram restos.
Me disseram esperança —
recebi espinhos
no estômago, no sexo, no coração.
Não há recibo do que sofri.
A vida não emite nota fiscal.
Sou a mercadoria vencida
jogada no fundo da prateleira do mundo.
E sigo vivo,
porque não aprendi a morrer.
Mas cada dia me esfaqueia um pouco mais.
E eu sorrio com a boca rasgada,
tentando parecer inteiro
enquanto carrego tripas nos bolsos.
Nenhum comentário:
Postar um comentário